quinta-feira, 7 de abril de 2011

Entrevista feita em 2005 pela Revista Marie Claire

Fenômeno genuíno da favela, a carioca Tatiana dos Santos Lourenço circula à vontade pelo mundo das socialites da zona sul. Seu escracho explícito, já acoplado ao codinome Quebra Barraco (transa, na gíria funk), arranca aplausos nos bailes de subúrbio e nas cintilantes passarelas da elite. A princesa Paola de Orleans e Bragança, por exemplo, delirou na pista durante o seu show, na festa do estilista Ocimar Versolato, há quatro meses. Para contagiar públicos tão distintos, Tati abusa das letras apimentadas, que descrevem preferências sexuais sem pudor. Fora dos palcos, no entanto, essa moça de 25 anos, que foi mãe aos 13, se revela acanhada com a fama.

Avisa logo que não gosta de dar entrevistas e esta talvez seja a última. Em um discurso pontuado por frases curtas, e por vezes ríspidas, ela conta que o universo dos desejos de consumo sempre foi estranho à realidade do lugar onde nasceu e cresceu, a Cidade de Deus. Na mesma favela que inspirou o violento filme do diretor Fernando Meirelles, ela se sente protegida: "Fora daqui é que tem risco".

A caminho do terceiro CD, sondada por grandes gravadoras, Tati se dá ao luxo de recauchutar o visual com um pacote de cirurgias plásticas programado para o início deste ano. Mas não abre mão de viver entre os seus, na comunidade. Foi lá que Marie Claire a encontrou, primeiro no apartamento da mãe, depois sentada no meio-fio e, por fim, na varanda da casa da comadre, em um fim de tarde chuvoso no Rio de Janeiro.

Marie Claire A sua frase "sou feia, mas tô na moda" virou hit. Ela ainda se aplica?
Tati Quebra Barraco Claro. Nada vai mudar a minha personalidade. Sou feia, estou na moda, mas um dia passa. Tem muita casa de família aí para eu trabalhar, ser babá, sei lá. Quando a fama passar, à toa é que não vou ficar.

MC O que você faz para ficar mais bonita?
Tati Vou ao salão toda semana, no Méier [zona norte], faço escova e unha. Compro as minhas roupas na Gang [grife preferida das funkeiras, famosa pela calça que "levanta o bumbum" das mulheres].

MC Que mulher você acha bonita?
Tati A Sheila Carvalho, as meninas do programa "Caldeirão do Huck". Tem muita mulher bonita por aí, dá até raiva [gargalhada]. Não tenho olho grande no que é dos outros, cada um tem as suas coisas. Mas essas mulheres, com esse corpo, dá vontade de dar nelas.


C O sucesso mudou muita coisa na sua vida nesses últimos quatro anos?
Tati São seis anos de sucesso. Desde 1999 [quando passou a ser conhecida no Rio] vou para o shopping e todo mundo me reconhece, me pára.

MC Mas no início você só era conhecida no Rio e não recebia tanto jornalista em sua casa...
Tati Até vinha, um e outro. Quando estourou mesmo [em 2004], foi um caos. Passou a vir mais gente quando a Fernandinha Abreu cantou a minha música no Rock in Rio: "Se tem amor a Jesus Cristo..." [canta].

MC Você gosta da fama?
Tati Para ser sincera, não gosto. Não escolhi ser MC [mestre de cerimônia funk]. Aconteceu. Uma coisa é escolher, outra é acontecer. Não estou acostumada com esse ritmo. Toda hora tem um me ligando, vindo aqui. Quando não quero atender, a pessoa quer saber onde estou. Isso tudo aconteceu de um dia para o outro. A partir do ano que vem, não vou mais dar entrevista para ninguém. Não gosto, não ganho nada com isso. Para que gastar três horas numa entrevista? Só para a minha cara aparecer numa revista?

MC Como você era antes do sucesso?
Tati Mudou tudo. Antes, não esquentava a cabeça. Os meus filhos sempre foram criados com a minha mãe. Eu ia para a pista, chegava, bebia todas. No outro dia, eu acordava, arrumava a casa, fazia um curso de cabeleireira, trabalhava na cozinha da creche da favela.

MC Não tinha sonhos de criança?
Tati Nunca pensei no que ia ser quando crescesse. Depois botei na cabeça de ser cabeleireira, que é uma coisa que dá dinheiro e curto muito. Fiz curso de estética e queria fazer um de tinturista e escovista. Mas acho que não teria paciência de botar cabelo como eu boto [
Tati faz megahair uma vez por mês, numa sessão que pode durar até 12 horas].

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